quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Fricção - Projeto Quarta que Dança 2011

16.11 Cine-Teatro Solar Boa Vista, 20 horas, R$ 2 (inteira) 23.11 Centro Cultural Plataforma, 20 horas, R$ 2 (inteira) 30.11 Sala do Coro do TCA, 20 horas, R$ 2 (inteira) http://www.fundacaocultural.ba.gov.br/qqd/2011/friccao.html

sábado, 23 de abril de 2011

Crítica no Jornal A Tarde sobre Fricção: Quando esse olho vê: corpo, guerra, dor e erotismo no espetáculo “Fricção”






publicado em 22/04/2011
A tarde, caderno 2+
Milena Britto – Professora adjunta da Universidade Federal da Bahia

O espetáculo “Fricção”, concebido e performatizado pela coreógrafa e dançarina Isaura Tupiniquim, traz à discussão os corpos tensionados por forças trágicas e uma condição da platéia: o voyeurismo.
Com o corpo sendo a passagem de tudo, a técnica de Isaura está ali, aprimorada pela sua trajetória no balé e dança moderna, mas as experiências que deixam o corpo em “estados de” são o que tornam os seus movimentos efetivos, viscerais.
O aspecto conceitual - desenvolvido junto ao filósofo Washington Drummond- revela a profundidade da performer: as referências para esse corpo tensionado em camadas históricas estariam da filosofia à midia; com entradas marcadas pelo erotismo de Bataille, pelos registros de guerras, por uma certa plástica hitleriana, pelo dadaísmo da banda alemã Einstürzende Neubauten, o neosurrealismo de um filme como Eraserhead, de David Lynch e, no centro de tudo, a estética “tecnológica” das máquinas desse tempo de guerras.
Há beleza em seus movimentos de homem-máquina, em seu balé sutil, em seu arquear falsamente desengonçado, o seu gênero que se indefine e se subjetiva ao mesmo tempo. Há dor, solidão, angústia, surpresa, medo.
A iluminação é assinada pelo design de luz Márcio Nonato, artista que tem uma trajetória junto ao grupo pluriartístico Dimenti. Márcio acentua os sentimentos do corpo em foco captando detalhes e deixando-os suspensos, próximos à platéia; por outro lado, desde fora, o corpo em cena e os movimentos agigantam-se.
O voyuerismo selvagem vai sendo atacado e, ao mesmo tempo, recuperado como parte de um processo criativo. O dispositivo de espionar é parte de uma maquiavélica relação entre os sujeitos.
A perversão disso é o que definiria a condição “humana” ou “desumana” do corpo especulado. Especialmente aquele em meio a guerras; as de hoje, brutalmente bélicas ou invisíveis, e, mais atrás, o que aconteceu nos campos de concentração, as marchas espetaculares de exércitos, a dança dos canhões, o balé dos soldados, o sexo desprezado e pervertido, as violações e profanações do corpo, o sangue – ou o leite - derramado em nome da paz: todas as guerras que estão em nossa memória coletiva, toda a versação institucionalizada da História da Moral.
O cenário é mínimo. O figurino tem força nas “próteses” desenhadas por Gaio Matos. O fetiche, o uniforme, a máquina são signos elaborados com pouco, num grande acerto do artista.
A ambientação sonora, operada pela Dj Lívia Losd, joga-nos nas geografias desérticas dos campos de guerras, das prisões, no silêncio espantoso de corpos que desaparecem e ressurgem. Agudamente administra os sentimentos da performer através de uma combinação de efeito musical que exaspera a platéia e conduz os movimentos ajustando-os aos sentidos.
Com a base na música conceitual da banda Einstürzende Neubauten, os efeitos criados são sempre únicos, aventando-se em cada espetáculo outra possibilidade de dizer o mesmo. Os vidros, os metais, as correntes que se arrastam, o eco de batidas secas ou desordenadas, a ópera, o silêncio... sob a música, corpo e mente são prisioneiros da experiência, não sem resistência. Estamos friccionando e friccionados e a Dj capta bem esse processo no palco e fora dele.
As transições de cenas são também de sentimento e de experiência. O corpo pode ser máquina, mas ele vai se descobrir humano e outra vez se converter em máquina. Camadas de processos históricos.
Isaura Tupiniquim traz para a arte contemporânea da terra diferença com profundidade. Arrisca bastante, aliás, o risco tem sido a sua marca nas performances assinadas por ela, que pesquisa o corpo em seus entraves contemporâneos, nessas tensões onipresentes em nosso tempo. Ela recusa-se à paz e à beleza contemplativa, exaspera-se, convulsiona-se em cena. Ela transita nos depósitos de restos de corpos modificados pela história dos conflitos, metáfora para aquilo que restou de nosso sonho de progresso.
Alguns poucos momentos saíram do eixo, em transições muito longas, uma marca do espetáculo. Algumas vezes, um movimento transicional tarda muito e se repete, retirando um pouco aquilo que seria parte da mesma história: a surpresa. Um corpo pode ser transformado também de maneira fulminante, como um braço que se vai com uma bomba ou um orgasmo que faz o rosto retorcer-se em segundos.Por outro lado, alguns momentos desses são a jóia da cena.
Irônica, a artista concede um momento de beleza plástica mergulhada em audácia: compõe com fragmentos de sentido, iluminação e forma, uma imagem viva, um quadro Batailliano - aliás, a “História do Olho” está presente numa referência plástica na cena final do leite. O espetáculo tem nos dois “finais” um ápice contraditório: enquanto uma imagem viva de seu corpo se ergue pelo sentido da grande ironia, um derrière virado à platéia nos largos segundos que a iluminação eterniza, o ato rege a liberdade daquele ser recém autônomo; e, para encerrar o triunfo de ter deixado o expectador preso até ali, de presente para a platéia uma prova de seu próprio veneno, imagens trágicas, fechando o ciclo daquele acordo: o voyeur que invade a privacidade, que consome as guerras, as cenas midiáticas das tragédias é o mesmo que espiona feliz e excitado o sexo do outro pela fechadura. Perversão na dor e no erotismo. Bom espetáculo!


segunda-feira, 4 de abril de 2011

Fricção - teatro de operações

Nesse momento a sociedade contemporânea vivencia a experiência de uma guerra interminável que não mais se dá no conjunto dos países como na 1ª e 2ª guerra, estágio ultrapassado do guerrear, mas na permanência da uma guerra fragmentada e contínua espalhada por todos os continentes. Embora, alguns conflitos bélicos ganhem destaque e conhecimento mundial, sobrevive às escuras uma miríade de pequenos conflitos nos confins do globo e sem projeção midiática. Estes não alcançam o status de notícia globalizada, salvo se apresentam algum massacre que sirva para a boa-consciência dos sem-guerras.

Para a maioria dos cidadãos contemporâneos a arte da guerra é completamente desconhecida e mesmo as suas atualizações estratégicas e tecnológicas nos passam despercebidos, pois este é um saber para especialistas. Entretanto, sofremos um outro tipo de guerra: o bombardeio incessante de imagens midiatizadas e espetaculares desses conflitos. Por mais distantes que pareçam, devido ao estágio cultural tátil em que vivemos, suas imagens nos acediam. Essa é nossa única e interminável guerra: o convívio conflituoso com essas imagens de horror que se impõe como pão nosso de cada dia. O ambiente das imagens reprodutíveis, descontextualizadas, circulando sem fim, de tela em tela, é o nosso front e o desafio que se impõe será interpretá-las, interpelá-las com todas as armas que pudermos agenciar. Do contrário estaremos submetidos a esse regime de imagens frias de medo e violência.

O trabalho de dança Fricção se insere de uma maneira renovada nessa peleja, apresentando suas armas concebidas esteticamente. O que nos mostra é que esse processo de decodificação e desafio frente a essas imagens não só está em andamento mas que será impossível nos furtamos desse embate. O campo estético em que ele se encontra e se movimenta é o da reapropriação das imagens bélicas, flagrando-as em associações que antes nos eram estranhas: belicismo, erotismo, corporalidade, dança, performance... Antes de uma vitória ou do campo pacificado e triste de uma derrota a obra se coloca em suspensão e risco, instaurando um campo de luta ou, como no jargão bélico, um teatro de operações, quando a performer em sua simulação estética joga com nosso próprio destino, a saber, o enfrentamento solitário dessas imagens terríveis.

Por Washington Drummond*

*Doutor em Arquitetura e Urbanismo, (PPGAU-UFBA), com Bolsa Sandwich CNRS/Laios – Paris. Leciona História Contemporânea e Teoria da História na Universidade Estadual da Bahia, Professor-Colaborador do Programa de Pós Graduação em Crítica Cultural – UNEB e do Programa de Pós Graduação da FAU-UFBA.

terça-feira, 22 de março de 2011

Manifesto futurista de Marinetti sobre a guerra!


Em seu manifesto sobre a guerra colonial da Etiópia, diz Marinetti: "Há vinte e sete anos, nós futuristas contestamos a afirmação de que a guerra é antiestética... Por isso, dizemos: ...a guerra é bela, porque graças às máscaras de gás, aos megafones assustadores, aos lança-chamas e aos tanques, funda a supremacia do homem sobre a máquina subjugada. A guerra é bela, porque inaugura a metalização onífica do corpo humano. A guerra é bela, porque enriquece um prado florido com as orquídeas de fogo das metralhadoras. A guerra é bela, porque conjuga numa sinfonia os tiros de fuzil, os canhoneios, as pausas entre duas batalhas, os perfumes e os odores de decomposição. A guerra é bela, porque cria novas arquiteturas, como a dos tanques, dos esquadrões aéreos em formação geométrica, das espirais de fumaça pairando sobre aldeias incendiá-Ias, e muitas outras. Poetas e artistas do futurismo ... lembrai-vos desses princípios de uma estética da guerra, para que eles iluminem vossa luta por uma nova poesia e uma nova escultura".

Walter Benjamin - Magia e Técnica, Arte e Política, ed. brasiliense. cap. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. pg:196

primeiros ensaios: fotos de Jorge Itaitú



sexta-feira, 18 de março de 2011

Das Palavras de Márcio... designer de luz do projeto Fricção

pós ensaio dia 18 de março de 2011

FRICÇÃO NOS OLHOS E NOS 7 BURACOS DA MINHA CABEÇA

Um barulho de cidade compassado... de construção! Marcação da vida que continua. O tempo do “tudo ao mesmo tempo”, tudo na frente dos olhos, tudo das gentes na gente...

é só olhar no espelho, se perceber...
Olho pelo espelho do olho de outro, outra pessoa. As minhas metáforas entram pelas portas dos olhos e cabeça. Criam um espaço no entendimento, e transforma as coisas. Me coloco a fruir, a degustar, a friccionar olhos e cabeça, interno e externo... e fricção vira encontro, vira opostos, vira pé no chão!
Ponho-me a olhar... começa o ensaio, Isaura pára de frente ao espelho, se olha, se coloca... a música preenche o espaço, a vida lá fora está acontecendo. E eu fico ali, a olhar Isaura, e Isaura no espelho, e começo minha sucessão de “os” e “as”:
A guerra
O algoz
A vítima
A deformação
A cidade
O “ao redor”
A vida que passa longe tão perto
A mulher
O espelho
As palavras
O não entendido
O peso
O espaço modificado
O belo na sua idéia de beleza
A exposição
O interno no externo do interno
A dominação
A tensão no corpo, do corpo, do suor, dos músculos... a tensão que tá na cabeça, na imagem... nos ecos
A arte, que está no fazer e no representar, o discurso de um discurso... e de outro e outro...
Agora, ao escrever, me vem “o sOl é umA estrelA!”.
Na lembrança me vem a sensação...
A impressão do misto de coisas no espaço. O “olho pra ela que sou eu”.
O discurso no corpo, o se colocar à “viver o que se propõe”, esse estado já gera em mim um interesse, um preenchimento, uma coerência! Gosto de ver as coisas se misturando, transformando-se umas nas outras... Dando a possibilidade de uma ser a outra!
Então tudo pode ser tudo! Uma colcha de retalhos, nós que somos vários!
A sutil forma de fazer “Hitler”, os mil significados de sedução, se seduz... se colocar, escolher o papel da vítima, a vítima de tudo aquilo!... tudo se deforma, o corpo se deforma de partes dele mesmo...
e há beleza nisso?
O Bellmer no corpo! Ao vivo! In loco! A deformação colocada com outras palavras e metáforas! O corpo repartido, as partes de um todo! Os pedaços recolocados, remontados numa nova pespectiva.
Uma guerra! Várias guerras! Está aí, o tempo todo! De dentro para fora, pra dentro e pra fora... num ciclo interminável, nas perguntas de ação.
O clima de... O espaço de... Os corpos de... O peso de...O estado de...
A guerra instaurada, estetizada, colocada na frente dos olhos! A direção dos olhos rumo aos entendimentos/sentimentos!
Muita coisa!
Muita muito!

A luz começa a aparecer, recortando, resignificando, relendo e relevando o corpo!
A fricção de cor e branco, de horizontal e vertical, de escuro e claro. O piscar de olhos! As maneiras que se encontram pra criar tensão, a tensão que já se está. Fazer as questões aparecerem e desaparecem no espaço, nos olhos, no corpo.
Ajudar a tornar o espaço corpo, denso, visível. Friccionar as brechas do corpo com luz, com rastro que cria sombra, que cria sobra! O espaço que pode se tornar visível, que pode esconder Isaura, que pode revelar outra parte ou partes ou a própria imagem de Isaura!
Daí, tudo se discute...
Tudo fricciona
Tudo vira guerra





Tudo vira o que o olho reconhece, estranha e procura...

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Fricção... novas investigações... Projeto aprovado pelo Prêmio Festival Internacional VIVADANÇA 2011 5ª edição - Teatro Vila Velha

Fricção* trata-se de um projeto solo em dança que tem como argumento a fricção entre imagens de guerra e o universo erótico. A partir de fotografias de guerras como no caso da famosa e violenta imagem da criança que corre nua e desesperada com o corpo queimado de napalm** na guerra do Vietnã, ou da figura firme e ardilosa do Hitler em “situação de poder” proponho um olhar erotizante sobre a guerra. A relação dessas imagens define o estado de atuação do meu corpo decorrente da utilização de próteses externas constituídas de materiais rígidos e móveis, que produzem múltiplas qualidades de movimento e desvios de corporalidade. Essas próteses serão estruturas com rodas pequenas distribuídas/acopladas em diferentes partes do corpo (principalmente na região posterior), sendo que algumas colocadas estrategicamente terão sistema de fricção, o que possibilitará maiores impulsos e arremessos do corpo no espaço, bem como, brecadas violentas, além de deslizamentos fluidos em nível com o chão. Aqui, aparece a relação corpo-máquina explicitada em Crash, tanto no livro de J. Ballard quanto no filme de Cronnemberg, atmosfera ficcional que nutri-se do erotismo por velocidade e colisões entre automóveis. O espaço cenográfico do trabalho será estabelecido pelo recurso da iluminação e disposição de objetos que são superfícies para diferentes texturas (leite, espuma, entre outras ainda não definidas). O estudo da luz será desenvolvido no trabalho para criar recortes sobre o corpo de maneira a contrapor partes deste corpo, como nas figuras do artista plástico Hans Bellmer*** - que também será fonte inspiradora para criação de corporalidade na obra. O design de luz em Fricção terá constante diálogo com a ambiência sonora feita pela DJ presente em tempo real, formando um jogo sensorial de superposição de luz, imagens projetadas e sonoridade, em movimento lento ou frenético, delimitando assim, a trajetória do corpo em luz ou sombra. O que se pretende é uma experiência sinestésica. A mediação entre máquina-tecnologia--guerra-corpo será então marcada de erotismo, abusando do senso estético. As imagens de Leni Riefenstahl - cineasta e fotógrafa que produzia as imagens de propaganda do Nazismo - sobretudo no filme O triunfo da Vontade, serão interpretadas como estetizantes do corpo bélico fascista. A guerra apresentada como extensão da política ou um estado de exaltação da mesma, não mais como uma exceção espetacular, mas principalmente ordinária, cotidiana e estetizada, é que gera a complexidade de pensá-la nos dias atuais, e fará dessa investigação cênica em dança um campo fértil de imagens e história. Nessa perspectiva o corpo aciona estados de violência e posturas de poder ao mesmo tempo em que erotiza. A alternância desses estados, dinâmicas e qualidades corporais ultrapassam a pura representação ao compor com a imagem e provocar nuances do movimento a partir da analogia entre as duas imagens propostas - menina no Vietnã (fotografia)/ Hitler discursando (filme) - que nesse sentido, irão friccionar períodos e contextos bélicos distintos. As relações expostas aqui, entre referências históricas e artísticas parecem formar uma rede de sentidos para a imaginação estética que vem compondo esse processo criativo em dança, que parece ser formado por recortes/partes, nesse caso a composição será organizada de maneira a friccionar partes cênicas aparentemente separadas.


* Fricção (força resistindo o movimento relativo de duas superfícies no contato, ou em uma superfície no contato com um líquido. Esfregação, Atrito. Para o general Clausewitz é um conceito na guerra: “A fricção, ou o que aqui chamamos assim, é, portanto o que torna difícil o que na aparência é fácil". “A fricção é o único conceito que distingue a verdadeira guerra daquela que se faz sobre o papel”)
** Napalm foi desenvolvido em 1942 durante a Segunda Guerra Mundial nos Estados Unidos por uma equipe de químicos. São fluidos incendiários (tais como os usados nos lança-chamas) que salpicam e escorrem muito facilmente devido à sua baixa viscosidade.
*** Hans Bellmer, artista plástico alemão surrealista. Como repúdio ao fascismo e a estética da propaganda Nazista, cria meninas bonecas tridimensionais em poses eróticas.

Ficha Técnica:

Concepção e Performer: Isaura Tupiniquim

Orientação conceitual: Washington Drummond

Design de luz: Márcio Nonato

Design de próteses: Gaio Matos

DJ e ambientação sonora: Lívia Drummond (Lívia Losd)

Apresentações confirmadas para os dias 14,15,16 / 28,29,30 de Abril ás 20hs no Teatro ICBA.